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Fernando Pessoa (1888- 1935) |
Olá amigos internautas,
Estou na iminência de ir para Portugal fazer "sanduiche", ops...vou explicar... Vou cumprir a minha bolsa de doutorado PDSE, ou seja, bolsa Sanduiche, concedida pela CAPES. Vou para a Terra da querida Florbela Espanca mergulhar na poesia, local melhor que Portugal para fazer isso? O Tejo para mim é pura poesia! Bem, alegria total em ser acolhida pela Universidade de Évora, deixo aqui registrado o meu agradecimento público a professora Ana Luisa Vilela, que amorosamente aceitou contribir para com a minha pesquisa e assinar o convênio Uévora/UFES. Animada pelo espírito Luso-brasileiro deixo aqui para vocês algumas linhas sobre o Pessoa, esse monstro de mil faces...
O que dizer do Fernando Pessoa que ainda não foi dito? Bem, mesmo que eu repita o que vocês já sabem, acredito que, assim como eu, não devem estar cansado de ouvir as delícias e inquietações que brotam das mentes de Alberto Caieiro, Ricardo Reis, Alvaro de Campos, Bernardo Soares, Antônio Mora, Alexander Search, alguns dos inúmeros heterônimos pessoanos.
Fernando Pessoa nasceu em Lisboa, Portugal, sua obra é complexa e vasta tanto na poesia, quanto na prosa. Um caso clássico de possessão poética, Pessoa dedicou-se a traduzir verbalmente as vivências íntimas de cada personagem que criou, e que de certa forma, acabaram por criá-lo. A poesia Pessoa é uma teia imbricada na qual se unem a estética, a politica, a sociologia, a filosofia, a psicologia, enfim, o escritor tece um panorama da modernidade reunindo variadas tradições do passado e do presente.
Alberto Caieiro criou um sistema metafisico que se apoia no paganismo, nele o sujeito está integrado a natureza e totalmente entregue à contemplação. Querem algo mais zen? O verso de Caieiro é livre (de escolas e movimentos). Caieiro promove uma valorização dos sentidos e renega a religião. Toda essa operação da linguagem acontece de forma imagética. Já Ricardo Reis, discípulo mais próximo de Caieiro, está inserido na civilização, embora também comungue com seu mestre a proximidade com o natural. Caieiro busca a gênese, o principio do mundo, já Ricardo se ampara na civilização grega e se inspira em Horácio e Epicuro. Na poesia de Horácio ressoam ecos de poetas arcaicos como Alceu e Safo por exemplo. O eu poético quer aprender e praticar a arte do bem viver. A linguagem de Ricardo Reis é vernacular e o tom que utiliza é professoral, ao estilo clássico. Ele ressuscita deuses exilados pelo cristianismo reinventando o paganismo e questionando, dessa forma, se há realmente a possibilidade de religação com o natural.
No ritmo da modernidade Alvaro de Campos entoa as suas odes: Ode triunfal, Ode marítima. Gritos, uivos e o barulho citadino dos maquinários dão forma a uma poesia inovadora e experimental que aponta para o desconhecido. Na Passagem das horas, o eu lírico anseia abarcar o mundo, ele quer tudo, mas, esse tudo é impossível e o eu lírico se pega em um beco sem saída. O eu foge, então, para o banal da vida cotidiana (Tabacaria). A angústia que assola o homem moderno transforma Alvaro de Campos em um niilista (Bicabornato de soda). Alessandra C. M. Magalhães diz que "a criação poética pessoana precedeu a criação dos personagens". Fátima Freitas Morna destaca que "o mundo criado na poesia de Pessoa é o ponto de reunião de uma pequena humanidade". Bem, quem é pai de quem, quem surgiu primeiro, sinceramente são discusões que acredito serem secundárias, para mim, o que mais importa é que Pessoa apontou algo muito contemporâneo, a impossibilidade da leitura da poesia como verdade absoluta, ou seja, apontou o abismo que existe entre o eu empírico e o eu poético, dessa forma ele potencializou o ficcional, o literário.
Bem, espero não ter feito nenhuma confusão entre os heterônimos, este pequeno ensaio foi feito no pulo, uma rapinha... (risos) e tem um tom de emulação (mais risos). Não precisa concordar comigo, visse? Mas, estou certa que no quesito Fernando Pessoa, somos todos unânimes!
Hoje estou bastante feliz... então lá vai:
Beijos para todos
Beijos para todos
Renata Bomfim
Não sei quantas almas tenho
Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: "Fui eu ?"
Deus sabe, porque o escreveu.
Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: "Fui eu ?"
Deus sabe, porque o escreveu.
(Fernando Pessoa)
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